terça-feira, 15 de novembro de 2011

Cidadania Cósmica

“O Espiritismo não cria a renovação social; a madureza da Humanidade é que fará dessa renovação uma necessidade. Pelo seu poder moralizador, por suas tendências progressistas, pela amplitude de suas vistas, pela generalidade das questões que abrange, o Espiritismo é mais apto, do que qualquer outra doutrina, a secundar o movimento de regeneração; (...)”
A Gênese Cap.XVIII  - ITEM  25


Cidadania é a prática da convivência social, respaldada na cooperação e na cumplicidade.
O ato da cidadania significa formar uma cosmovisão da vida, integrando-se no ecossistema planetário de forma construtiva e solidária. O princípio estrutural dessa cosmovisão é a natureza, interdependente do homem em sua trajetória evolutiva. Uma rede de processos e sistemas sustenta o dinamismo natural da evolução, no qual o homem receberá retorno conforme os resultados felizes ou infelizes na forma de interagir com esse “todo”.
Sob a ótica universal, a palavra sociedade tem seu conceito ampliado. Inicialmente ela é o contexto cultural no qual o espírito renasce corporalmente, conquanto saibamos ser impossível dissociar as sociedades intercontinentais e também a espiritual, pois formam um ecossistema universal.
Nesse ecossistema galáctico, ao findar do segundo milênio, a humanidade carnal contabilizava aproximadamente 6,5 bilhões de almas sob a tutela da reencarnação, enquanto os “censos” espirituais davam conta de24 bilhões de espíritos fora do corpo. Nesse cenário, de 30 bilhões de seres inteligentes compondo a população geral do planeta, algumas conjecturas otimistas levam-nos a calcular um contigente de espíritas em 1%. Esses dados servem-nos para aferir o que representa ser espírita em pleno século XXI, considerando alguns poucos milhões de criaturas adeptas das propostas doutrinárias, ou com alguma forma de contato com as obras elementares do Espiritismo.
Com esse tesouro incomensuravelmente valioso para a felicidade da Terra, temos de nos perguntar: qual será a nossa postura como cidadãos, perante a gama de tragédias e problemas sociais que afligem os continentes materialistas? Estamos fazendo brilhar a luz e assumindo o papel de “sal da terra”?
A reclusão dos pólos de produção espírita, no contexto das céleres mudanças no orbe, é algo que merece demorada atenção de quantos guardam poder de influência na opinião, ou daqueles que se interessam em promover um debate urgente sobre a participação efetiva do espírita nessa etapa, que o senhor Allan Kardec designou como período da renovação social.(10)
Torna-se imperativo estudar a questão da convivência dos centros espíritas com a sociedade. Observam-se, sem exageros, corações sofrendo por ausência de orientação espiritual, mas residindo ao lado das abençoadas agremiações de amor. O objetivo dos núcleos doutrinários deve ser a formação do homem de bem(11), através da participação consciente e responsável no progresso. O receio infundado ou mal conceituado de proselitismo tem incentivado um distanciamento das necessidades comunitárias. Essa omissão estabelece uma aura de pureza nos círculos de Espiritismo, com adoção de condutas puritanas, quando se espera autenticidade, alegria e melhoria de quem lhes freqüenta as frentes de serviço. Dessa forma, impede-se a possibilidade do diálogo participativo e realista, sobre as lutas pessoais nas experiências diárias, subtraindo o ensejo de conduzir as temáticas espíritas para uma contextualização.
O desenvolvimento de “projetos cidadãos” será excelente alternativa para que as células de Espiritismo promovam-se, da condição meritória de casas de caridade assistencialistas, para sociedades geradoras de responsabilidade social e integração libertadora. Não basta o estudo informativo. É imperioso levar essa cultura doutrinária ao patamar de transformação efetiva e promocional, atingindo o caráter de institutos de ética e cidadania à luz do espírito imortal.
O eminente educador Paulo Freire nos asseverou, em oportuno debate na vida espiritual, que “o desenvolvimento de projetos de convivência social, ou a ecologia social, deve ter como prioridade a educação moral “no” povo, porque essa é a educação que transforma e, da qual, todas as camadas sociais necessitam, contando ainda com a natural facilidade de não poder ser impedida por parte de nenhuma estrutura hegemônica ou conservadora. Essa educação apregoará uma cidadania centrada em deveres, mais do que em direitos, concitando o homem à tomada de uma nova postura social.”
Essa educação moral, mais que passar conteúdos espíritas, será a iniciativa de inserir a “pedagogia de projetos”, preparando a criança, o jovem, o adulto e o idoso ao desenvolvimento de habilidades afetivas, produtivas, cognitivas e espirituais, pertinentes à cosmovisão de vida que o Espiritismo nos proclama, integrando-nos na condição de seres universais proativos.
Precisamos aprender a florir onde formos plantados.
A pedagogia da assistência promocional é valorosa, porém, subjetiva e, nem sempre, educativa na sua atual configuração um tanto “conversionista”. Mais que difundir conceitos carecemos de desenvolver valores, laborar com as competências que brotam do intercâmbio natural, entre os centros e a comunidade, prezando, antes de tudo, a convivência, a parceria, banindo a reducionista expressão “assistência social”, substituindo-a por “responsabilidade social”, ou outra que melhor atenda a essa característica de cidadania. Urge deixar de conceber essa iniciativa dos Centros Espíritas como mera tarefa, passando a aplicá-la como um campo natural de interação renovadora, um pólo atrativo para engrandecimento de almas que se dispõem a gozar e confirmar a sua condição de cidadãos cósmicos.
Distanciemo-nos das miragens da presunção e da arrogância, as quais nos levam a acreditar em teses religiosas descabidas de conversão em massa. Nem o espírita nem o Espiritismo terão ingredientes suficientes para provocar a renovação social. Ao contrário, a sociedade é que decide, na sua sagrada condição de livre-arbítrio, o “instante Divino” de absorver a Verdade e buscá-la. Nesse momento, os conceitos imortais,  como assevera o codificador, vão secundar, isto é, vão coadjuvar esse processo, em razão de seu poder moralizador e de suas tendências progressistas. Compete, pois, aos que já se encontram na lides da espiritualização de si mesmos, o dever de abrir janelas para o mundo, atestando com seu exemplo o esplendor da mensagem rediviva do amor, em plena forma de viver como Cidadãos do Universo.
                                                                                        

Ermance Dufaux, Livro: Unidos pelo Amor - cap. 7 - 1ª parte


(10) Revista Espírita – dezembro de 1863 – Período de Luta.
(11) O Evangelho Segundo o Espiritismo – Cap. XVII, item 3.

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